A Arbitragem no Poder Público Municipal

O instituto da arbitragem na solução de conflitos de direito privado em substituição ao Poder Estatal jurisdicional tem sido consagrado na legislação nacional e referendado pelos Tribunais nacionais. Contudo, a proposta de inserir o Poder Público na arbitrabilidade das demandas é mais recente e ainda merece análise criteriosa sobre a indisponibilidade do bem público, mas ainda assim, tem sido muito bem-vista como forma de solução de conflitos.
Se antes se negava a possibilidade da utilização da arbitragem para dirimir os litígios, a legislação nacional, de forma lenta e gradual, foi superando tal ideia, inserindo inclusive o Poder Público nesse contexto. A aceitação da arbitragem, uma forma privada, externa ao poder estatal na solução de conflitos, com poderes de imposição final e coercitiva de suas decisões, ainda que chocando os pensamentos mais tradicionais, encontrou aceitação no sistema jurídico, fazendo frente inclusive a um judiciário cada vez mais lotado de processos, lentos, e muitas vezes sem especialidade para entendimento do objeto litigioso.
Avançar sobre a “interesse público” com essa forma de solução torna-se ainda mais um grande desafio jurídico, e que foi objeto de inovação legislativa pela Lei 13.129/15, trazendo o Poder Público para a possibilidade arbitral. Contudo, pela natureza da “res” pública, muitos pontos ainda necessitam ser clareados, como a necessidade ou não de licitação prévia para contratação do órgão arbitral, do compromisso arbitral, o respeito ao regime jurídico dos precatórios previsto na Constituição Federal e quais os bens públicos disponíveis passíveis de serem submetidos à arbitragem
Os avanços da arbitragem no plano legislativo e concreto no Brasil são inegáveis. No primeiro aspecto, sem a pretensão de exaurir, o CPC/15, em diversas passagens, insere a arbitragem em paralelo com o Judiciário, sepultando eventuais dúvidas que ainda pairavam sobre se a atividade arbitral seria ou não jurisdicionante, e ainda agora a inclusão do Poder Público na possibilidade de adoção da arbitragem em seus conflitos.
A maioria dos casos arbitrados no direito privado tratam de Direito Societário, fornecimento de bens e serviços, aluguel, Direito Empresarial, construção civil e energia. Por outro lado, os números de arbitragem envolvendo o Poder Público ainda são inexpressivos, mostrando que ainda se tem muito para evoluir nesse campo. Os entes federativos mais expressivos, como a União Federal e alguns Estados membros tem se utilizado com vantagem de tal instituto, com legislação própria local e equipes treinadas no assunto, abreviando contendas e tendo decisões mais próximas da especialidade de suas demandas.
Podemos constatar que em diversos casos ela se apresenta como um mecanismo mais adequado para dirimir alguns conflitos, muitas vezes complexos, e mesmo com valores elevados, mas sobressaltando inúmeras vantagens, como a maior especialização decorrente da escolha consensual dos árbitros especialistas e o curto tempo de duração do procedimento.
A arbitragem não é uma via de escape do Judiciário, mas uma solução adequada, inserida na possibilidade ampla de solução de disputas, fugindo do método único de confiar ao estado, muitas vezes ineficiente e inexperiente, especialmente em atividades mais complexas, de tecnicidades elevadas. A cada caso, em cada objeto deve-se analisar essas circunstâncias para escolha preferencial ou não do instituto de arbitragem para solução dos conflitos na administração pública. Essa análise tem sido feita pelos gestores públicos, especialmente em grandes e complexos contratos públicos, e em órgãos da administração de elevado potencial econômico.
Contudo, verifica-se que os municípios, com exceção de algumas grandes capitais, não têm se utilizado do instrumento da arbitragem e sequer possuem legislação específica regendo o assunto, quiçá equipes internas para lidar com essa possibilidade de solução de conflitos. Essa hipótese deveria ser melhor olhada pelos municípios, pois muitas vezes, serviços e obras são interrompidos por anos em razão de litígios levados ao Poder Judiciário e por conta da especialidade ou da complexidade do assunto, a demanda se torna longa e prejudicada pela falta de especialistas para auxiliar na solução da demanda.
Na arbitragem tem-se a vantagem, onde os árbitros (julgadores) são escolhidos como especialistas no objeto da demanda e não apenas profissionais da área jurídica. Essa especialidade e o rito da arbitragem, permitem uma solução mais rápida e justa ao tema tratado, dando ao governante local uma resposta mais imediata àquela obra ou serviço em execução, não interrompendo a prestação da atividade pretendida à população por longos períodos. Falta uma ação clara aos municípios na linha de obter essas vantagens nas suas demandas; dependendo a) de um melhor conhecimento do instituto, b) uma legislação específica e c) treinamento do seu pessoal interno.
Cabe esclarecer que vários Estados membros, bem como suas capitais, como São Paulo ou Rio de Janeiro, já possuem legislação própria e utilizam em suas demandas o instituto da arbitragem, com equipes e profissionais treinados no tema. Mas outros municípios, ainda que de menor porte, e especialmente seus governantes, que poderiam resolver demandas dentro do tempo de sua gestão e não perderem a solução para administrações futuras, deveriam olhar com mais atenção essa forma de solução de conflitos, verificando os benefícios desse instituto, como solução moderna e vantajosa, onde os administradores encontrarão meios ágeis de implantar suas políticas locais e os munícipes terão melhor e mais rapidamente implantados os serviços ou obras pretendidas pela administração.
LUIZ AUGUSTO BAGGIO
Advogado, Mestre e Especialista em Direito Público
Fonte: Valor Econômico
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