Perspectivas da Arbitragem no Direito do Comércio Internacional

O direito do comércio internacional ainda é pouco explorado no ambiente acadêmico[1], mas em franca expansão na medida em que empresas brasileiras e estrangeiras necessitam de instrumentos de estabilização de transações econômicas internacionais, sobretudo em virtude de diferentes culturas jurídicas.

Se as transações econômicas ocorridas no âmbito do Direito nacional já estão sujeitas aos mais variados riscos, as transações econômicas internacionais envolvem mais de uma ordem jurídica nacional e, por conseguinte, encontram-se consideravelmente menos protegidas. A submissão de transações comerciais a diferentes marcos de regulação, jurisdições nacionais negativa ou positivamente conflitantes e déficits de informação local inevitavelmente expõem ainda mais os agentes econômicos. Neste contexto, os juristas que atuam no comércio internacional têm papel relevante não apenas na estabilização de tais transações, como também no contencioso e/ou arbitragem que daí venham a surgir.

Há inegável relevância da arbitragem na resolução de transações comerciais internacionais disfuncionais, harmonizando a cultura jurídica de partes sediadas em diferentes jurisdições. Além da aplicação do direito estatal definido na cláusula ou compromisso arbitral, os árbitros que atuam no comércio internacional contam eventualmente com a lex mercatoria, os usos e costumes do comércio internacional, ainda que em caráter subsidiário em alguns casos[2], para adjudicar a disputa, reduzindo custos de transação e diminuindo riscos inerentes aos negócios.

Assim, a existência de múltiplos sujeitos e relações jurídicas na cadeia logística (carga e navio, despachantes aduaneiros, agentes transitários (freight forwarders), agentes de carga, armadores sem navios (non vessel operator and common carrier), agentes marítimos, dentre outros) tendem a contar cada vez mais com modernos meios de resolução de controvérsias, destacando-se aí a arbitragem comercial.

Não obstante a relevante atuação consultiva dos juristas na orientação legal, facilitação das comunicações, redução de custos de transação e incremento da confiança negocial, são comuns os litígios derivados de operações de comércio internacional. Em muitas situações, a arbitragem se relaciona intimamente com áreas afins de Direito Marítimo, Portuário e Aduaneiro.

No âmbito do direito marítimo, são comuns arbitragens inerentes à relação entre armadores, afretadores, agentes de navios, exportadores e importadores. No dizer de Rosário Calabuig: Los documentos del transporte (los BL o bills of lading, así como las charter-parties o los sea-waybills…) constituyen los verdaderos protagonistas de los numerosos litigios e reivindicaciones que diariamente se generan y que, muchas veces e inevitablemente, se vem sujetas al imperio de los usos y prácticas del comércio marítimo internacional.[3]

Os atrasos na atracação de navios no porto, os custos da paralisação de navios além do que estipula a carga-partida (demurrage), as despesas de retenção do contêiner pelo consignatário além do período de graça concedido pelos armadores (detention ou demurrage), as dívidas privilegiadas contraídas por armadores no país que sujeitam seus navios a arresto, ilustram situações de grande demanda neste setor.

No que se refere ao direito portuário, a ANTAQ vem regulamentando cada vez mais o relacionamento da autoridade portuária e de agentes privados interessados na exploração de áreas e instalações portuárias, bem como impondo diretrizes para a navegação de cabotagem e longo curso no país. Este novo cenário traz a perspectiva de crescimento da arbitragem para a resolução de litígios oriundos de tais relações jurídicas.

Assim, o recurso à arbitragem no direito do comércio internacional responde principalmente aos interesses dos operadores do comércio exterior como via de resolução de suas controvérsias de modo rápido, econômico e ajustado a seus interesses comerciais.

Algumas Câmaras Arbitrais nacionais também despontam com protagonismo na resolução de litígios oriundos do comércio internacional como, por exemplo, a CAMESC em Itajaí-SC por sua localização estratégica e expertise na área. Corretoras de mercadorias e grandes traders brasileiros também apontam de maneira consistente em seus contratos de exportação e importação câmaras arbitrais em Londres (e.g. LMMA, GAFTA, FOSFA) como método alternativo de solução de controvérsias.

As perspectivas da arbitragem são promissoras no direito do comércio internacional.

 

Autor: André Luiz Bettega D’Ávila – MCiarb
Árbitro, Membro do Ciarb – Chartered Institute of Arbitrators
Advogado, sócio do Departamento de Contencioso e Arbitragem da Andersen Ballão Advocacia
Bel UFPR, Msc UFSC e Mestre pela The Fletcher School of Law and Diplomacy at Tufts University
Autor de O Direito do Comércio Internacional no Setor Agrícola (Boiteux, 2009)
Prêmio Análise de Advocacia 2010 e 2018, apontado como o Mais Admirado do Direito na categoria Importação & Exportação e Agronegócio

 

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[1] Uma exceção relevante é o Projeto Advocacia Internacional, da Faculdade de Direito da USP, que investiga a natureza e o alcance da atuação de advogados no âmbito do comércio internacional.

[2] LEW, Julien, Applicable Law in International Commercial Arbitration. 1978. p. 466 apud DOLINGER, op. cit., p. 79.

[3] CALABUIG, Rosario Espinosa. Resolución de Controvérsias y Derecho Aplicable em el Transporte Marítimo Internacional in Temas Atuais de Direito do Comércio Internacional – Vol. II, Florianópolis: OAB-SC Editora, 2005, p. 437.

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